Alguém já disse que escrever sobre música é como dançar
sobre arquitetura. Literatura e escultura, duas artes aparentemente distintas,
relacionadas a sentidos diferentes, uma racional, outra basicamente impressionista...
Nada disso. A inglesa Su Blackwell, nascida em 1975, reside
justamente na interseção entre essas linguagens. Esculturas e instalações que
têm como matéria prima os livros. Não exatamente seu conteúdo, mas o livro
material mesmo - papel, capa, letrinhas, volume físico.
Pergaminhos, papiros... O papel tem sido usado nas
comunicações humanas desde sua invenção, seja entre as pessoas, seja em
tentativas de se comunicar com o mundo espiritual. Su Blackwell apropria-se
desse material tão acessível e o submete a um processo irreversível de
destruição - ou reconstrução, tudo depende de sua visão pessoal sobre as coisas.
Para a artista, o processo se pretende um reflexo da
precariedade do mundo em que vivemos - o mundo real - e da fragilidade de nossa
vida, de nossos sonhos e ambições.
"Normalmente trabalho mergulhada no reino dos contos de
fadas e do folclore", afirma. "Minhas personagens costumam ser
meninas, inseridas em cenários às vezes até hostis, o que expressa a
vulnerabilidade da infância, ao mesmo tempo em que celebro a ansiedade e a
maravilha dessa fase da vida".
Segundo a própria artista, existe em seu trabalho uma certa
melancolia quieta, introspectiva, reconhecível desde a escolha das
matérias-primas até a seleção meticulosa de cores.
"Quando eu era pequena", diz, "passava muito
tempo brincando pelos bosques de Sheffield, mas em meu próprio mundo de
faz-de-conta. Eu dava nomes às árvores e acreditava que elas me
protegiam".
Seu universo artístico ficou completo já na adolescência, quando,
na escola, deparou-se com um curso de Têxteis. Dali até um mestrado na Royal
College of Art, em Londres, foi apenas questão de tempo. Se é que o tempo
existe no mundo do faz-de-conta.